segunda-feira, 27 de agosto de 2012

CENTENÁRIO DO 1º CONGRESSO DOS TRABALHADORES RURAIS

Intervenção proferida frente ao local onde há cem anos se realizou o 1º Congresso dos Trabalhadores Rurais e na presença do Secretário-Geral da CGTP-Itersindical Nacional.


Caras e caros amigos.

     Estamos aqui para assinalar o centenário do 1º Congresso dos Trabalhadores Rurais e da constituição da Federação dos Sindicatos Rurais, momento alto da luta sindical e da organização dos trabalhadores rurais que teve por palco a cidade de Évora.
     Convém recordar o contexto em que ocorreu o Congresso.
     O Movimento associativo entre as classes trabalhadoras portuguesas começou a tomar forma em 1839 com a constituição da Associação dos Artistas Lisbonenses mas, só em 1852 surge a primeira associação não mutualista – A Associação do Trabalho para os Fabricantes de Seda.
     A partir de 1870 o movimento associativo começa a ganhar forma mas somente nos maiores centros industriais: Lisboa, Porto, Setúbal e Covilhã.
     O Mundo rural – a maioria esmagadora do país – permanece distante quer do associativismo mutualista quer, do associativismo de classe.
     Em 1903 (dados fornecidos por Campos Lima- citado por A.V. em o Sindicalismo no Alentejo) existiam em Portugal  118 associações. No Alentejo 2 e entre elas a única associação de trabalhadores rurais, a Associação dos Trabalhadores Rurais de Beja[1].
     Em 1908 com a publicação do Jornal a Greve, dirigido por Alexandre Vieira e outros, são dados passos de gigante na propaganda sindicalista.
     Nesse ano, em Junho, Elias Matias – manufato de calçado ( cuja memória saudamos através dos seus familiares aqui presentes), Sertório Fragoso – operário tipográfico e outros fundam em Évora o Grupo Anarquista Avante! E iniciam uma intensa ação difusora e propagandista da ação sindical.
     Em 1909 realizou-se o Congresso Sindical e Cooperativista e a partir dele até à implantação da República somaram-se as lutas e greves envolvendo já (embora em número reduzido) os trabalhadores rurais. Mas é com a implantação da República que a luta dos trabalhadores se intensifica.
     No ano de 1910 realizaram-se atá ao 5 de Outubro 35 greves e só uma delas, de trabalhadores rurais. De 5 de Outubro e até final do ano realizaram-se 79 greves, 4 das quais de trabalhadores rurais: rurais de Portel, Moura, Setúbal e Cabeço de Vide.
     Em 1911 reúne o 2º Congresso Sindical e decide enviar uma comissão do Congresso como propagandistas do Sindicalismo nos campos.
     No dia 1 de Janeiro de 1911 é inaugurado na Rua do Raimundo, o Sindicato dos Rurais de Évora, com 490 associados e no final de Abril estavam criados 52 sindicatos rurais.
     A 18 de Maio realiza-se em Évora uma reunião magna dos sindicatos rurais que apresenta um conjunto de reivindicações aos proprietários. Estes respondem com a recusa a todas elas o que origina nova reunião magna a 28 de Maio, de novo em Évora.
     Os  55 sindicatos presentes  proclamam a greve geral para dia 31 de Maio de 1911e elegem um Comité de Greve composto por: Joaquim Candieira, José Cebola, Vital José e Tiago Varela – rurais, pelo Pastor Monzes – de Évora e pelos membros do Grupo Anarquista Avante – Sertório Fragoso, António Nicolau e Elias Matias .
     A greve paralisa os campos e junta milhares de trabalhadores em Évora. Ao 4º dia de Greve os proprietários cedem em toda a linha.
     A primeira greve geral dos rurais fora ganha.
    Em Dezembro os lavradores negam-se a cumprir o que acordaram em Junho e os trabalhadores voltam à greve a 1 de Janeiro de 1911.
     Agora a repressão foi brutal, O poder republicano manda encerrar as sedes sindicais, espancar, prender e espingardear os grevistas: um trabalhador foi morto e centenas de outros foram feridos, no Largo Severim de Faria.
     A greve geral alastra a todo o Alentejo e a Lisboa e Setúbal. Em Portalegre são presos 12 trabalhadores que se manifestavam contra a repressão sobre os grevistas e em Lisboa é encerrada a Casa Sindical e presos mais de 500 trabalhadores. Na Moita os populares lincharam o Administrador do Concelho.
     A Greve é derrotada, persistem as prisões e os sindicatos continuam encerrados. Os trabalhadores das várias classes profissionais resolvem arrendar uma casa na Rua da Freiria de cima, nº 21 e aí instalar todos os sindicatos.
     Estava criada Casa Sindical de Évora e a União Local dos Sindicatos.
    A casa sindical de Évora, diz o relatório da Comissão de propaganda na província do Alentejo, é uma espaçosa habitação, co jardim e aula. Nela estão instalados os Sindicatos dos rurais, co 1800 sindicados, o dos carpinteiros civis com 70, o dos manufatores de calçado com 150, o da construção civil e artes auxiliares com 120, o dos corticeiros com 500. Os sindicatos dos caixeiros com 80 e o dos pedreiros com 90 são igualmente aderentes da União Local e é provável que venham a habitar na Casa Sindical[2].
     Foi neste contexto que a 25 e 26 de agosto se reúne neste local na cidade de Évora o Congresso Corporativo dos Trabalhadores Rurais.
     O Congresso teve lugar na sede da União Local de Évora sedeada no nº 21 da Rua da Freiria de Cima, onde nos encontramos, tendo como principal objetivo a constituição da Federação Nacional dos Trabalhadores Rurais.
     No Congresso participaram 39 sindicatos representando 12525 trabalhadores rurais de Alcáçovas, Alpiarça, Amieira, Arraiolos, Aviz, Azaruja, Beja, Campo Grande, Castelo de Vide, Coruche, Cuba, Egrejinha, Évora, Évora-monte, Ferreira do Alentejo, Monte de Trigo, Machede, Montoito, Odemira, Portalegre, Portel, S. Manços, S. Miguel de Machede, S. Tiago do Escoural, Terrugem, Torrão, Torre de Coelheiros, Val Pereiro, Vendinha, e Vil’Alva.
     Às 16,30 horas do dia 25 de agosto de 1912  tiveram início os trabalhos do Congresso que nesse primeiro dia foram presididos por Manuel Ferreira Quartel – delegado da Associação dos Rurais de Coruche, secretariado por Carlos Rates – delegado da Comissão Executiva do Congresso Sindicalista e João Bernardo Alcalena – delegado da União dos Sindicatos de Évora.
     Estava aberto o caminho. Os rurais entravam definitivamente na luta sindical.
     Hoje aqui e agora cumpre-nos reafirmar que a luta de ontem, de hoje e de amanhã continuará até conseguirmos os objetivos sonhados pelos que aqui estiveram há cem anos: uma terra sem amos, A Internacional!



[1] Campos Lima – citado por A.V. em o Sindicalismo no Alentejo.
[2] Relatório da Comissão de propaganda na província do Alentejo, assinado Por Carlos Rates.

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